Capítulo 1 — Onde Nasce um Rio

Jares
13 min readJun 19, 2022

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— Faz uma porra que ele faz! — Paulo esbravejava contra a televisão.

De dentro de seu quarto, Yasmin conseguia escutar o pai brigando na sala com a apresentadora do jornal local, o que significava que já passava do meio-dia e ela estava terrivelmente atrasada para sua aula de Anatomia Topográfica na universidade. A noite de sono perdida finalizando o artigo, a ser apresentado dentro de poucas horas, já cobrava sua dívida: os olhos e cabeça pesados já não eram capazes de fazer a distinção entre a artéria braquiocefálica e a veia intercostal superior em uma imagem esquematizada do mediastino. O fato de ela não ter comido nada nas últimas quatorze horas, completamente absorta na pressa de concluir o trabalho, também não ajudava em nada. Varando a madrugada, ela se culpou imensamente por ter deixado uma tarefa tão importante para o último dia. Não era do seu feitio se distrair, perder prazos, entregar atividades pela metade, mas de alguma forma havia acontecido.

— Como é aí, Paulo? — Andréia perguntou, também aos gritos, do quintal, achando que o marido a havia chamado.

— Saiu na chamada aqui — Paulo grita de volta — que o governador vai fazer saneamento no Rio Grande do Norte todinho.

— É o quê? — Andréia perguntou mais uma vez, não havia ouvido direito.

— Chegue cá! — berrou Paulo, finalmente.

Adréia largou as roupas que estava pendurando e foi até a sala.

— Sim, digaí o que foi.

— O governador, esse cara de tabaco, dizendo que vai sanear Natal e o resto do RN até o final do mandato.

— Só se Natal for o nome do bairro lá onde ele mora em São Paulo — Andréia retrucou, aos risos.

— Mas tu acha que ele faz fazendo mesmo? — Paulo retrucou, em tom mais sério.

— E tu tá com medo, é?

— Eu não! Tem nada a ver não. Hoje eu limpo fossa, amanhã eu posso estar vendendo seus dindin na rua também. Digo assim, que se fizesse mesmo era bom.

— Será? Eu fico pensando se não é um perigo esse Maia fazer um serviço seboso igual a venta dele e depois ficar estourando cano e fazendo rio de bosta na rua.

— Pior que é, viu, Andréia? Se nem a ponte velha que já vai com mais de ano caindo aos pedaços ele pega pra ajeitar…

— Pois é. Sendo para piorar, melhor ele nem se atrever a fazer. Fica roubando lá com os parentes dele que ele já tá acostumado — Andréia falou, saindo em direção ao quarto da filha.

Yasmin já estava desligando o computador quando sua mãe bateu à porta.

— Yasmin, mulher! Vai sair sem comer não, viu? Cuide que hoje você tem coisa pra apresentar lá que eu sei.

— Tô indo, mainha, só encerrar aqui. Qualquer coisa a senhora bota na vasilha que eu como lá quando der.

— Tudo bem, então vou adiantar logo pra não guardar quente, senão o frango azeda.

Assim que abriu a porta do quarto, já com todo seu material arrumado na mochila, sua mãe a recebeu com um pote de sorvete branco embrulhado em papel filme. Yasmin pegou o pote, colocou da melhor maneira que pôde no bolso maior, junto aos cadernos, deu um beijo na testa da mãe, agradeceu e saiu andando o mais rápido que podia. Já estava quase saindo quando ouviu da sala seu pai chamar.

— Sem correr! — disse Paulo, de sorriso largo no rosto — uma menina bonita dessa não pode chegar no meio da aula suada.

— Bença, painho? — Yasmin pediu, de mão estendida.

— Deus te faça feliz, meu amor. Avise sua mãe quando chegar, tá certo?

— Pode deixar, aviso sim.

E assim saiu pela porta. Vista de fora, a casa parecia maior do que realmente era. Tinha um espaço considerável de largura, mas era ocupado pelos quintais e becos. A casa em si estava isolada bem no meio do terreno, ilhada entre plantas e grandes argolas de cimento, as fossas sépticas que seu pai, conhecido como “Paulão Limpa Fossa” vendia, instalava e eventualmente limpava.

A parada de ônibus ficava na esquina da rua de terra, encostada em uma cigarreira verde. Não havia cobertura, nem lugares para se sentar, apenas a estrutura de ferro impecável, pintada nas cores azul e branco do partido de Eduardo Solrac, candidato à reeleição para a prefeitura de Natal. Ali, Yasmin esperava, com mais três pessoas, o ônibus da linha 60, previsto para passar às 12:45.

Se tudo corresse bem, ela desceria no shopping às 13:30, em tempo de fazer a integração com alguma das linhas que entram no campus, chegando ao laboratório de anatomia por volta das 13:50, apenas vinte minutos atrasada. Sim, cinco minutos além dos quinze de limite previstos pela faculdade, mas ainda assim um horário aceitável. Também seria uma opção descer na parada dos circulares, mais ou menos às 13:40, torcendo para que algum circular passe exatamente quando ela chegasse ao ponto, resultando no mesmo horário: treze horas e cinquenta minutos. “Claro, se tudo correr bem”, reiterou para si mesma.

A verdade é que esse emaranhado de cálculos de tempo era inútil agora e Yasmin sabia disso, assim como não fazia diferença a raiva que ela estava sentindo com a lentidão do motorista. Mesmo assim, subiu no ônibus às 12:45 fazendo cálculos — e sentindo raiva. Sentou o mais perto que pôde da porta de trás e colocou os fones. Não queria ouvir nada hoje, mas já estava acostumada com a sensação de pressão nas orelhas e gostava disso.

Sentar encostada na porta, infelizmente, implica ficar no “lado do sol”. Com a testa apoiada na cadeira da frente, Yasmin cochilava um sono febril, ao mesmo tempo a impedindo de descansar e de despertar, abrindo os olhos vez ou outra quando o motorista passava rápido demais em um buraco ou lombada.

Quando o arrependimento bateu, o ônibus já estava cheio e não havia como trocar de lugar. Ela estava de calça jeans, tênis branco e camiseta preta da turma. Os raios de sol a esquentavam como um ferro de passar esquecido em cima de um colchão. Ela ergueu a cabeça, cerrou os olhos e passou a mão na testa para secar o suor, os cabelos longos e pretos já grudados no rosto. O calor era tanto que ela cedeu seu lugar a outra moça e preferiu seguir em pé pelo resto da viagem.

Na verdade, ela não se importava de ir em pé. Nunca foi do tipo que corre atrás do ônibus assim que o vê ao longe para pegar o melhor lugar sentada. Tinha seus lugares favoritos, com certeza: bem atrás, na janela direita, onde podia ver tudo; também lá na frente, onde às vezes havia um assento sem outro ao lado. Mesmo assim, não corria. Ir em pé, principalmente ao voltar para casa, era extremamente comum. “Sendo assim, melhor se acostumar”, pensava.

Fez um número quatro com as pernas, coçando a panturrilha com a ponta do tênis, e fez menção de colocar a mochila no chão.

— Quer que eu leve? — interviu uma senhora, sentada à sua frente.

— Pode ser, obrigada! — Yasmin respondeu, baixinho, sem saber se a senhora havia de fato escutado.

Lembrou na mesma hora que seu pai vivia dizendo que “esse negócio de levar bolsa dos outros” — ou deixar que os outros levassem a sua bolsa — não prestava. Tinha medo que a filha fosse ser roubada em um instante de desatenção caso entregasse a mochila, ou pior! Carregasse a mochila de algum malfeitor em fuga, tentando se livrar de armas, drogas, carga roubada. Nas palavras dele, “só deus sabe o quê”. Uma parte dela se sentia culpada em desobedecer ao pai; outra parte dela se sentia culpada quando o obedecia e deixava a carga intacta nos ombros dos passageiros. Não havia escapatória, nem coisa “certa” a se fazer.

Todos esses pensamentos, ponderou, lhe atravessavam enquanto o ônibus atravessava a ponte velha, cujo adjetivo “velha” na verdade era novo, porque só lhe foi dado depois da construção da ponte “nova”, cujo adjetivo “nova” dependia da existência prévia de uma ponte que a precedesse. Ocorreu-lhe então que nada é de fato novo ou velho por si só. Aliás, a coisa alguma seria atribuído valor nenhum, não houvesse algo antes que a pusesse em perspectiva; também de nada valeria haver algo último, que não implicasse a expectativa de outra coisa futura. “Eu carrego a bolsa, carregam as bolsas por mim. As bolsas não se carregam sozinhas. A existência é um perigo mútuo”, pensava, como se fosse escrever uma tese, enquanto suportava o peso da cabeça na dobra do cotovelo, o braço erguido segurando a barra amarela.

Quando deu por si já estava na Bernardo Vieira, a duas paradas de descer. No susto, puxou a corda. O ônibus parou de vez, a porta traseira se abriu e ninguém se aproximou das escadas. Qualquer olhar minimamente atento acusaria que ainda não era o lugar corretor para descer. Atordoada, Yasmin deu um leve cutucão na senhora sentada com sua mochila, puxou a alça para o braço esquerdo e, quase como de um salto, desceu. Nem ela entendia o que havia feito. Assim que o ônibus a deixou para trás, tirou o celular do bolso e apertou o botão de bloqueio. O sol bem em cima da sua cabeça criava um reflexo altíssimo na tela, fazendo com que fosse impossível ver qualquer coisa daquele jeito. Franziu o cenho, cerrou os olhos, pôs a mão em forma de concha sobre o aparelho e confirmou: eram treze horas e vinte e seis minutos.

“Nenhum ônibus para nessa bosta! ”, pensou, já com ódio do que estava por vir. Na verdade, muitos ônibus paravam duas paradas antes de onde ela queria ter descido, mas nenhum deles entrava no campus. Yasmin precisava correr. Ela odiava correr.

Enquanto corria pela calçada, pensava na ironia de suas reflexões. “E eu aqui fazendo conta de horário de ônibus e pensando se tudo ‘corresse’ bem… olha a palavra que a minha cabeça foi pensar! ”, era o pensamento que ela tinha emaranhado aos novos cálculos: quantos metros até a próxima parada? Quantos minutos até o próximo ônibus? Quantas pessoas estavam olhando estranho para ela enquanto ela corria desengonçada? O quão suada ela estaria ao entrar atrasada em sala? Tudo ao mesmo tempo, suor e sono se entranhando em seu desespero, quando ela vê um ônibus com “Via Campus” — escrito em letras luminosas na lateral direita — entrando na avenida, cerca de dez passos à frente. Alívio. Suor, sono e alívio.

Ela subiu ainda ofegante, a camiseta preta colada ao corpo. Na boca, o gosto de sangue de quem trincou os dentes com muito mais força do que deveria, talvez até tendo mordido a língua. Passou pela catraca e se sentou ao fundo, o mais longe possível de qualquer outro passageiro. Se sentia suja, fedorenta e horrorosa. Agora com menos luminosidade, checou novamente na tela do celular o horário. Eram 13:31, ela conseguiu. “Porra, eu consegui! ”, ela dizia baixinho enquanto vibrava e se acabava de rir. Bastou a euforia passar um pouco para que ela notasse o óbvio — estava completamente ensopada de suor e precisava ao menos disfarçar os efeitos do seu recente feito de atletismo involuntário. Na mochila não levava toalha, nem outra peça de roupa que pudesse usar como toalha, nada além do almoço, livros de anatomia surrados e…

— O jaleco, boe! — ela exclamou, mais alto do que gostaria, fazendo com que alguns passageiros olhassem para trás.

Enfiou a mão bem fundo na mochila, até sentir uma sacola plástica por baixo dos livros. Puxou com cuidado e ali estava o jaleco, limpinho e dobrado, com seu nome bordado no ombro direito. Rasgou a sacola e começou a esfregar o tecido branco pelos braços como pôde. Era um dia quente demais para se estar dentro de uma lata de ferro sobre rodas e o jaleco nem de longe secava o suor com perfeição, mas era isso ou nada. A cadência para se secar também era muito importante — nem lento demais que não desse tempo de alcançar todo o corpo, nem rápido demais para não suar mais ainda com o esforço.

Quando decidiu parar de se secar e olhar um pouco pela janela — coisa que em dias menos atípicos fazia durante quase todo o trajeto — já estava dentro da universidade, chegando ao seu setor. Amassou da melhor maneira que conseguiu o jaleco dentro da sacola rasgada e deu um nó antes de colocar tudo de volta na mochila; estava úmido feito um pano de chão. Levantou-se, puxou a corda e desceu.

O ambiente universitário fascinava Yasmin desde os tempos de ensino fundamental. Mesmo tendo a área médica como sonho de infância e convicção vocacional, todos os anos ela visitava o campus na semana da mostra de profissões, sempre assistindo ao máximo de palestras que podia. Ela adorava andar pelos enormes estacionamentos, cobertos pela sombra das árvores e dos prédios de cada faculdade diferente. Por onde passava, via uma infinidade de gestos, cores e formas diferentes nas pessoas, sempre em movimento. Todo ano ela podia se sentir parte desse organismo vivo pulsante por uma semana inteira, a passos leves e sonhando com o dia em que poderia ser parte dele “para sempre”.

Hoje, suada, com fome, com sono e atrasada para mais uma aula do mesmo professor, no mesmo setor do mesmo prédio, precisando atravessar o mesmo interminável estacionamento, um verdadeiro labirinto de carros importados, ela se sentia um hospedeiro indesejado nesse organismo.

Subiu as escadas, dois degraus por vez, até o seu bloco. Já na porta da sala do laboratório, olhou mais uma vez para a tela do celular antes de abrir. Eram 13:52, ela havia calculado certo, bastava abrir a porta, pedir licença e desculpas pelo atraso. O máximo que poderia acontecer era receber de volta a indiferença ou uma cara feia do professor. “Sinceramente, foda-se”, pensou, a mão firme segurando a maçaneta. Ela ia entrar já com o artigo em mãos, deixar na mesa do professor, ocupar seu lugar no laboratório e esperar sua vez de apresentar. Até que caiu a ficha — que trabalho? Era para ser óbvio a essa altura, mas a pressa em chegar a fez esquecer — ela ainda não havia imprimido o artigo.

Largou a maçaneta da porta, agora molhada do suor de suas mãos, e apressou o passo pelo corredor, em direção à sala da xerox. Não era exatamente um imprevisto, apenas uma lacuna naqueles cálculos de quando subiu no ônibus. Ela sempre saía mais cedo de casa e imprimia seus trabalhos na xerox. A quinze centavos a página, era bem mais cômodo do que parcelar em doze vezes o valor de uma impressora. Procurava o pen drive na mochila enquanto caminhava, tateando pelas brechas dos bolsos.

A sala de impressão estava excepcionalmente agradável e vazia, com o ar condicionado ligado no mínimo permitido pelo departamento. Ao abrir a porta, Yasmin pôde sentir o ar frio escorregar por entre a suas pernas, lhe causando um arrepio acompanhado de uma sensação de leveza. Talvez estivesse tudo bem, afinal — bastava desacelerar um pouco.

Já de mochila fechada e pen drive em mãos, foi direto ao balcão.

— Moça, boa tarde! É só pra imprimir um arquivo do word.

— Qual o nome?

— Só tem ele aí — Yasmin deslizou o pen drive pelo balcão com as pontas dos dedos, timidamente.

— Tá ok.

Enquanto esperava pela impressão, percebeu a frequência cardíaca se normalizando junto com o ritmo respiratório. Puxou mais uma vez o celular do bolso só para confirmar que já eram duas. Na verdade, ainda faltavam dois minutos, mas a essa altura ela já não estava mais a calcular nada. Ia entrar na sala de cabeça erguida e ignorar todo o resto, estava decidida.

— Ficou dois reais e setenta — disse a “moça da xerox”, acidentalmente interrompendo os devaneios de Yasmin.

— Ah, claro. Só um segundo.

A mochila que ela levava à faculdade era cheia de compartimentos internos, bolsos dentro de bolsos e espaços vazios. O grosso do que trazia eram livros enormes e pesados — como naturalmente são os livros de medicina — então esses espaços serviam para acumular lixo, panfletos que recebia na rua e moedas. Como não havia separado o dinheiro da impressão antes de sair de casa, teria que garimpar os trocados, entre cupons do McDonald’s e papéis de bala amassados.

— Só um minuto, tá? Rapidinho.

Até agora ela tinha achado um total de um real e oitenta centavos, sendo uma moeda de real bem no bolso da frente e as demais embrulhadas em uma nota fiscal qualquer. Segurava a bolsa pela alça com a dobra do cotovelo, usando uma mão livre para chafurdar pelos bolsos e a outra para segurar o dinheiro.

— Tem quanto aí? Pode levar, depois você vem deixar o resto — interveio a moça, percebendo a angústia dela depois de alguns minutos procurando trocados sem sucesso.

— Obrigada — respondeu Yasmin, baixinho, sem querer olhar a moça nos olhos, e saiu.

Dois reais. Ela não tinha dois reais para pagar por uma dúzia de folhas de papel. Estava atrasada, suada e agora, como sua mãe costumava dizer, “com o choro no pé da goela”. Mesmo assim, caminhava mecanicamente de volta, em direção à porta do laboratório, como um animal sendo levado para o abate, segurando o trabalho impresso pelas pontas para não encharcar as páginas de suor.

Dessa vez, não parou para checar as horas, já era irrelevante. Abriu a porta de cabeça baixa, pediu licença de maneira quase inaudível, atravessou do escuro total até a luz do projetor e do projetor até o escuro novamente para colocar seu trabalho sobre a mesa. Não parou para pensar nem por um segundo no silêncio absoluto que se instaurou assim que ela passou na frente da apresentação de slides. Sentia que estava invisível e — com tudo que já havia passado por uma simples tarefa — insensível. Não pensava mais em nada, seguindo em direção à mesa vazia no fundo do laboratório.

— Yasmin! — exclamou do escuro uma voz masculina e nasalada.

Yasmin se virou.

— Oi, professor — respondeu, sem emoção.

— Dentro do meu laboratório, aluno usa o jaleco. Se não tiver trazido, não pode assistir aula.

Ela ficou ainda alguns segundos parada, sem reagir. Sentia-se fraca, como se fosse desmaiar ali mesmo, como se lhe tivessem perfurado o coração.

Soltou a mochila com toda a força no chão, fazendo um barulho que virou consigo todas as cabeças em direção a ela. “Foda-se, não importa, foda-se, não importa”, pensava em turbilhão, feito um disco arranhado. Abriu o zíper e tirou de dentro a sacola molhada com o jaleco. Sem dar fé do nó que havia improvisado mais cedo, rasgou a sacola novamente e a jogou para trás, ficando com jaleco amassado nas duas mãos. Ela tremia de ódio.

A sacola de supermercado havia largado tinta no tecido úmido, deixando tudo em um tom amarelado e encardido. A roupa era fria e cheirava a frango, provavelmente do almoço que azedou na bolsa. Vestiu os dois braços enquanto pegava a bolsa do chão, agora tremendo também do frio que o suor causava contra o corpo em uma sala climatizada.

— Pode continuar, Fernando — disse o professor, fazendo com que o silêncio cessasse.

Aquele instante havia durado horas. Agora, parecia nem ter acontecido. A única coisa que ela tinha para garantir que esse dia estava sendo real eram os odores desagradáveis que se impregnavam por ela.

Nesse momento, se alguém tivesse incidentalmente olhado para trás, veria nascer em silêncio, dos olhos de Yasmin, todo o rio Potengi.

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